Continho de amor em dezembro

Meu horóscopo me aconselhou a começar dezembro contando uma história de amor. Como não tenho nenhuma na manga, recorro a um conto publicado em Nova York no princípio do século XX. Seu autor era um tal de William Sidney Porter, mais conhecido como O. Henry, sujeito que cumpriu pena por “desvio criminoso de fundos” e depois se tornou um dos maiores contistas do Ocidente.


Como costuma acontecer quando um homem pobre encontra uma mulher pobre, Jim e Della resolveram juntar os trapos e romanticamente dividir sua pobreza. Moravam num apartamento mobiliado, a oito dólares por semana. Ele trabalhava na cidade, mas ganhava pouco. Ela acalentava sonhos de riqueza, mas a única coisa que lhe cheirava à prosperidade eram os próprios cabelos, lindos e ondulantes “como uma cascata de águas castanhas”.


Com a aproximação do Natal, Della cismou que precisava dar um bom presente a Jim. Mas o que poderia comprar com a miséria que conseguira poupar nos últimos meses? Já que tudo vale a pena se a paixão não é pequena, nossa brava nova-iorquina dirigiu-se à casa de uma certa Madame Sofronie, fabricante de perucas, e aceitou vinte dólares — outra miséria — em troca dos seus belíssimos cabelos.


Com um lenço amarrado na cabeça, Della vasculhou as lojas da redondeza até encontrar o presente ideal para seu amado: uma corrente de platina que ele deveria usar para prender o relógio herdado do pai, o único bem realmente valioso que possuía. Tremendo de ansiedade, Della voltou para casa e aguardou o retorno de Jim. “Meu cabelo cresce rápido”, pensava. “Espero que não me ache feia até lá”.


Jim chegou no horário de sempre. Antes de beijar a esposa, notou que havia algo diferente:


— Cortou o cabelo?


— Sim, meu amor; cortei e vendi, mas foi por uma boa causa.


E a ele entregou o embrulho com a nova corrente do relógio.


— Então seu cabelo se foi? — repetiu Jim, como um idiota.


— Fiz mal, querido?


— Bem, é que…na verdade…


— Eu só queria deixar você feliz. Com a corrente nova, seu relógio vai ficar muito mais bonito.


Com isso, Jim começou a rir, a gargalhar. Tirou um pacote do bolso do sobretudo e tratou a entregá-lo à amada:


— Também comprei uma lembrancinha para você. Mas, para isso, tive que vender o relógio.


Della abriu o pacote e soltou um grito de — alegria? Não, de decepção. Era um jogo de pentes caríssimo que há tempos vira numa vitrine da Broadway.


E é assim que encerramos: uma corrente que não encontrou o relógio, um jogo de pentes que não encontrou cabelos, um casal que fortificou o amor e um cronista — eu mesmo —que mal e porcamente seguiu os conselhos do seu horóscopo.

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