Pérolas Literárias

Roberto Bolaño (1953-2003), autor de 2666

Todos já devem ter recebido aquelas listas com as pérolas descobertas nas redações de vestibular.


Exemplos:


“O problema fundamental do terceiro mundo é a superabundância de necessidades.”


“Em Esparta, as crianças que nasciam mortas eram sacrificadas.”


“Oceano é onde nasce o Sol. Onde ele nasce é o nascente e onde ele desce é o descente.”


Desconfio que, entre as pérolas autênticas, deve ter muita coisa inventada pelos espíritos brincalhões que povoam a internet, pois não é possível que os estudantes brasileiros — mesmo os estudantes brasileiros! — sejam tão burros e distraídos.


Seja como for, semear pérolas num texto não é privilégio de vestibulandos relapsos. Também abundam na internet as pérolas encontradas nos grandes jornais. São muito mais divertidas, já que fatalmente imaginamos a cara do assinante tentando entender o que está escrito.


Exemplos:


“A polícia e a justiça são as duas mãos de um mesmo braço.”


“Ao que tudo indica, a vítima foi morta pelo seu assassino.”


“À chegada da polícia, o cadáver se encontrava rigorosamente imóvel.”


Mas não adianta ficar tirando sarro de estudantes e jornalistas. Hoje meu objetivo é enumerar algumas pérolas fabricadas por escritores, teoricamente os guardiões da correção e da elegância da língua. Encontrei a lista em 2666 (o título é assim mesmo, em números), extraordinário romance do chileno Roberto Bolaño (1953-2003).


Lá vai:


“Pobre Maria! Cada vez que percebe o ruído de um cavalo que se aproxima, tem certeza de que sou eu.” (Chateaubriand).


“Vamos embora!, disse Peter procurando seu chapéu para enxugar lágrimas.” (Zola).


“Com as mãos cruzadas nas costas, Henry passeava pelo jardim, lendo o romance do amigo.” (Rosny).


“O cadáver esperava, silencioso, pela autópsia.” (Feuillet).


“Guilherme não imaginava que o coração pudesse servir para algo mais que a respiração.” (Argibachev).


“Começo a enxergar mal, disse a pobre cega.” (Balzac).


“Depois de cortarem a sua cabeça, enterraram-no vivo.” (Zvedan).


“Tinha a mão fria como a de uma serpente”. (Ponson Du Terrail).

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